quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Reduzir maioridade penal é burrice e imoralidade

Além disso, é insconstitucional

Projeto de emenda constitucional  que modifica a idade da maioridade penal foi proposto hoje pelo Senado. Os senadores mostraram desinformação.

crianças_na_prisão_Indonésia

A opção pela maioridade penal expressa na Constituição Federal não foi baseada numa "idade do discernimento". Em 1940 o Congresso Nacional não achava que no minuto seguinte ao completar 18 anos é que o brasileiro adquiria "discernimento".

A opção pela maioridade penal aos 18 anos é fruto de opção política do Brasil e cláusula pétrea da Constituição Federal – firmada pelo País em tratados internacionais de Direitos Humanos, inclusive –, o que estabeleceu dois sistemas correcionais: um sistema penal, para maiores de 18 anos, e um sistema socioeducativo, para menores de 18 anos, conforme explica o Juiz José Henrique Rodrigues Torres, presidente do Conselho Executivo da Associação de Juízes para a Democracia, nesta entrevista concedida à jornalista Lúcia Rodrigues, da Rede Brasil Atual.

Áudio da entrevista do Juiz - Rede Brasil Atual, Jornalista Lúcia Rodrigues (clique para ouvir):

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A maioridade penal não pode ser alterada. No entanto, os dois sistemas correcionais brasileiros podem e devem ter suas falhas estudadas, ser revistos, melhorados e aperfeiçoados. Isso demanda esforços de todos os brasileiros, principalmente, mas não exclusivamente, daqueles que ocupam cargos públicos. Ao invés de propor redução da maioridade penal – o que não se sustentará em nenhuma Corte – deveriam trabalhar para corrigir o que há de errado nos dois sistemas correcionais brasileiros.

É função do Congresso Nacional e do Poder Executivo solucionar os problemas dos dois sistemas correcionais brasileiros. Se não o fizerem, têm muito menos autoridade moral ainda para propor redução alguma de maioridade penal – já não têm autoridade para isso, juridicamente falando, porque a imputação penal foi implementada como uma política de Estado, um pacto social; portanto, não pode mais ser política de governo. Ou será que os senadores querem que vamos reduzindo a maioridade penal paulatinamente, até terminarmos como a Indonésia, onde crianças de 8 anos de idade são condenadas à prisão e encarceradas juntamente com adultos? Isso resolverá os nossos problemas de criminalidade? Não. Portanto, trabalhem para solucionar o problemas na raiz, senhores senadores, deputados, presidente e governadores.



 

 

Capitalismo de esquerda marginaliza índios


Nós e os índios (extratos)

Alfredo César

"Nossa civilização criou formas de vida que beiram a inviabilidade. Emporcalhamos nossas cidades; poluímos nosso mar, nossos rios, nosso ar; destruímos nossa natureza; criamos necessidades que nunca serão preenchidas a contento, gerando inúmeras frustrações, tamanha é a roda-viva do consumismo que determina nosso estilo de vida. Segundo Celso Furtado (que hoje, graças a Dilma Rousseff, dá nome a um petroleiro), no seu O mito do desenvolvimento econômico, "[o] custo, em termos de depredação do mundo físico, desse estilo de vida é de tal forma elevado que toda tentativa de generalizá-lo levaria inexoravelmente ao colapso de toda uma civilização, pondo em risco as possibilidades de sobrevivência da espécie humana." Quanto mais universalizamos nosso consumismo predador, mais rápido destruímos nosso ambiente e planeta. O que teríamos a aprender, afinal, com os índios?
Assurinim - Xingu

"O que dizer de um povo que vive há milênios em co-adaptação com o ecossistema amazônico, tirando da floresta o sustento da vida, em vez de tirar a floresta de sua vida (uso aqui o jogo de palavras do próprio texto de Viveiros de Castro)? Os índios são radicalmente cosmopolitas. A palavra "cosmopolita" quer dizer "cidadão do mundo". Cosmos, na filosofia grega significa "universo organizado de maneira regular e integrada". Se permanecermos fiéis à etimologia da palavra, cosmopolita seria então o cidadão de um universo harmonioso (cosmo é o antônimo de caos). Por anos, filósofos antigos e modernos têm pensado o termo "cosmopolitismo" como uma técnica de convivência entre povos. O cosmopolitismo radical dos índios nada mais é que uma técnica de convivência e co-adaptação com o cosmo – o universo, o ambiente, o planeta. A destruição do planeta hoje parece mais plausível em decorrência da falta do cosmopolitismo radical dos índios do que do cosmopolitismo dos filósofos. O que teríamos a aprender com os índios? Algo muito simples e complexo: aprender a habitar o planeta.

"O mesmo governo que tanto fez para tanta gente (e atuou como uma força descolonizadora no tocante às ações afirmativas e na introdução de história africana no ensino médio), é aquele que age como um poder colonizador na Amazônia, e aliado objetivo dos fazendeiros do agronegócio no Mato Grosso do Sul. Desse modo, o Estado e seus sócios ocupam a terra com prerrogativa desenvolvimentista, como se fosse um território vazio, pronto para o usufruto dos agentes econômicos. Nada muito diferente dos bandeirantes. O que antes vinha coberto com retórica de missão civilizatória cristã, agora é celebrado como a chegada do progresso. Nos dois tipos de bandeirantismo, a destruição vem justificada por um discurso de salvação. O índio que habita nessas terras é tratado simplesmente como obstáculo que deve ser removido em nome do progresso da nação (progresso no caso representa: carne de gado no Mato Grosso e energia elétrica para indústrias do alumínio na Amazônia).

Surui Paiter - Rondônia

"O índio apresenta um desafio para o pensamento da esquerda no Brasil. Um desafio que ainda não foi pensado como desafio, pois a esquerda ainda enxerga a "questão indígena" como um problema que deve ser resolvido. O desafio, ao contrário do problema, não exige uma resolução, mas uma autorreflexão. Os índios nos fazem repensar nosso modo de vida, e até mesmo o conceito de nação. Como salientei, o índio não se insere na matriz nacional-popular que mobiliza tanto a nossa imaginação. E não se insere nela pois, ao contrário do retirante, do favelado, do pobre, do negro, o índio não está buscando integração à modernidade (a grande promessa do lulismo às massas). Os índios parecem querer reconhecimento do seu modo de vida (como se pode ver nessa entrevista de Davi Kopenawa). E, para viver do jeito que sabem viver, é necessário garantir as condições mínimas de possibilidade para sua vida: terra e rios que não sejam dizimados pela usina de Belo Monte, nem pelo garimpo; segurança e tranquilidade para não serem acossados pelos capangas do agronegócio, como no Mato Grosso do Sul. Essas são as grandes lutas hoje.
Mutirão de assinaturas pelo tombamento
da Aldeia Maracanã, Original Museu do Índio
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"A luta pelos direitos indígenas vai muito além de uma quitação da nossa dívida histórica. Mais do que um acerto de contas com nosso passado, a garantia dos direitos constitucionais dos índios é imprescindível para o nosso futuro. Precisamos cada dia mais da sabedoria desses cosmopolitas radicais, se quisermos repensar e refundar os pressupostos de nossa existência planetária."


Alfredo César
Originalmente publicado em Amálgama

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Todos os povos indígenas do Brasil (PIB Socioambiental)